domingo, 26 de dezembro de 2010

A ilha das Trevas

..." Foi nesse momento que ele me disse que matasse a Isabelinha. Pensei que tinha ouvido mal, de tal modo era monstruoso o que acabara de dizer, e pedi-lhe que repetisse. Com toda a calma, o capitão voltou a dar a ordem, com as mesmíssimas palavras . " Mata a tua filha"  "...


José Rodrigues dos Santos in A ilha das Trevas 




Há vidas que não são vidas, terras que não são terras, pedidos que não se devem fazer
Há memórias que não se esquecem mas que não deixam viver
Há livros que mais do que histórias contam desgraças, para quem quiser aprender...

sábado, 11 de dezembro de 2010

Sinto muito

" ... era assim que explicava o natal:


" Nossa senhora, minha mãe, teve uma menina. Era Abril, e quando a minha irmã nasceu, fiquei pasmado por aquele milagre, maior do que andar sobre as águas ou transformar pedras em pão. Na Galileia sussurram o meu nome, cresce a minha fama - pensei - mas milagre verdadeiro é este, o amor do meu pai da Terra. Amou a minha mãe, segredou-lhe ao ouvido coisas impossíveis, tocou-lhe a pele sem quebrar a teia. Viu-avestida de seda, depois, de fora, esperou a metamorfose, crisálida feita borboleta, rompendo o seu castelo de perfumes, onde se escondia, com o pudor dos bichos, do olhar dos homens. No seu casulo transformava-se, com um sentimento único, singular, oferta a que nenhum outro homem, em tempo algum irá gozar. S. José, meu pai, amou-a como um homem, ou como uma criança, o que é o mesmo. Jurou que ela era a vida e vida acrescentava. Terra onde nasciam coisas como o sorriso, o azul do céu, o verde que quase toca o mar. à sua mulher, minha mãe, disse coisas que as mulheres, por medo, não entendem. Achou-a envergonhada, e naquela noite explicou o que o anjo quis dizer: " No futuro sábios falarão do buraco negro. Dirão que quando a estrela queima o coração, tudo o que o rodeia colapsa numa esfera pequenina, e que a morte da estrela chama a si Luz e Tempo. A minha estrela apaga-se no instante em que te amo, e com ela a vida e o tempo. Resta Deus, ou o que eu acho que ele é. Ou então a gratidão de existir, existindo perto de ti.Não há nada igual. Não te tenho porque és abstrata. Não existes porque não me é permitido, ou nunca me foi prometido instante assim. Não existo, porque amar como as estrelas está proibido. Não me deixarão amar assim, porque é demais, e tudo o que é demais viola a lei dos vituosos. ... "

Nuno Lobo Antunes in Sinto muito




O amor só é permitido a alguns iluminados, aos outros resta apenas as formas de amor expressas ao próximo, como que a si mesmo. Então aos pobres de amor resta apenas as migalhas que o Natal lhes traz, em forma de um presente embrulhado em cores de gratidão por ainda haver na Terra quem acredite...

domingo, 5 de dezembro de 2010

O poder dos sonhos

" Existem certamente indivíduos que temem os sonhos, os sonhadores e a capacidade de sonhar, e, no entanto, a presença dos sonhos e dos sonhadores é inesgotável."

Luís  Sepúlveda in o poder dos sonhos


" Sonho, e não me importo que uma visão do lucro como única orientação do Homem estigmatize os sonhos e os sonhadores. Considero-me um sonhador, paguei um preço bastante duro pelos meus sonhos, mas são tão belos, tão plenos e tão intensos que voltaria a pagá-los uma e outra vez "

Luís Sepúlveda in o poder dos sonhos





Um sonho é a  única verdadeira parte de nós que é totalmente livre. Cortar-lhe as pernas, abafá-lo, negá-lo, é condenar à perpétua condição de prisioneira, a vida que existe para nós.
Essa que é completamente irrepetível a cada segundo que passa 

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Os livros

"Não têm conta as vezes que me disseram: livro, posso ler-te?
Rio-me dessa gracinha com o umbigo."

livro -  José Luis Peixoto







Os livros não deviam ser escritos, são eles que vão ditando nossas vidas, a cada frase, a cada letra. 
Más pontuações, más interpretações
E quem se entende, quando o livro teima em escrever-se sozinho?
Quem sabe onde irão parar a vida dos personagens, alados nas asas da imaginação
Os livros não deviam ser escritos
Escrevem-nos o destino nas palavras que lá não estão, mas que nós vemos
e por isso buscamos em cada nova página um pouco da nossa história perdida, entre a pontuação